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Superando limites com deficientes visuais

Solange Gueiros

Da Escola Passos & Compassos

Há muito tempo eu desejava abrir um curso de dança de salão para deficientes visuais. Seria minha realização máxima da metodologia de ensino “Penso, logo danço”. Este método se consolidou em 1999, quando, por dois meses, ministrei aulas de dança de salão sentada, pois sofri um acidente de carro e imobilizei as duas pernas. Comecei a ensinar sem que o aluno copiasse meus movimentos. Afinal, eu não poderia fazê-los. O aluno não tinha a referência visual no momento do aprendizado, aprendia pensando e falando os movimentos, comparando-os com referências do dia a dia.  Então percebi que esta forma seria perfeita para ensinar deficientes visuais.

Neste ano abrimos nossa primeira turma. Temos 21 inscritos, dos quais 16 freqüentam as aulas regularmente, uma vez por semana. Os resultados foram surpreendentes. A metodologia ”Penso, logo danço” funciona muito bem. Em alguns passos fiz pequenos ajustes para ensinar, mas a maioria não difere da forma para as outras turmas. É surpreendente como eles demonstram grande senso de direção, e como pensam para entender a lógica dos movimentos, que é nossa base de ensino.

 

Foi emocionante a chegada dos alunos na academia para a primeira aula. Eu estava ansiosa, será que eles viriam? De repente, vejo uma turma do outro lado da rua, e lá vou  correndo para trazê-los para a academia. Primeiro fizemos um reconhecimento do local, andando pelas extremidades da sala e descrevendo detalhes. Bastou isso para que caminhassem sozinhos dentro da escola.

 

Na primeira aula fiz um acordo com eles: eu os ensinaria a dançar, e eles me ensinariam como tratá-los. Como eles dizem, são deficientes visuais, e não deficientes mentais. Precisam de um pouco de ajuda em algumas situações, mas são pessoas normais.

 

Um mês após o início das aulas, foram convidados a freqüentar os bailes da Vila Mariana. Era o primeiro passo para integrá-los no ambiente de dança de salão e na estrutura da escola. A receptividade dos alunos e bolsistas foi ótima. Passaram a freqüentar todos os bailes.

 

Agora nosso objetivo é integrá-los nas turmas normais de dança de salão. Dois já estão nas turmas da noite, junto com os outros alunos. A receptividade geral foi muito boa, e  em vários momentos a gente não percebe nenhuma diferença, eles fazem os movimentos como qualquer um.

 

Eles têm um astral fantástico, e brincam com a gente em relação às gafes que a gente comete enquanto está aprendendo a lidar com eles. Imagine um bolsista querendo ajudar, vai buscar a bolsa de um dos deficientes visuais, e aí pergunta: “É aquela azul?” No baile, um freqüentador tira uma das mulheres para dançar, estendendo a mão para ela, e não entende porque foi ignorado. Outra bolsista vai oferecer balas e eles não respondem. Vamos aprendendo o que fazer, muitas vezes através destas situações, e hoje já sabemos que eles se divertem junto com a gente.

 

Para o próximo ano pretendo abrir mais uma turma de deficientes visuais, e montar um grupo de dança com eles. É uma realização muito grande integrar estas pessoas no universo da dança de salão e torná-las mais felizes, junto com todos nós que dançamos

 

Milton Saldanha

Jornalista

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