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Entrevista

Tânia Agra

Figurinista de trajes para dança

 A arte do bem-vestir, nos palcos e nas pistas de dança

Tânia Agra, ex-bailarina e coreógrafa, e praticante de dança de salão por diversão, hoje dirige seu próprio ateliê de moda para palco e dança, em Petrópolis, RJ. Promoveu no 21º Festival de Dança de Joinville um inédito desfile de figurinos para dança, com coreografias, músicas e efeitos de luz, intitulado O Figurino na Dança. Manteve também uma exposição fixa durante todo o evento, no Centreventos Cau Hansen, com finalidade cultural. Nesta entrevista exclusiva ao Dance, Tânia fala sobre roupa de dança e faz sugestões para mulheres e homens que queiram se vestir bem nos palcos e pistas de dança, além de contar curiosidades sobre seu trabalho.

Dance – Existe alguma moda para dança, algum conceito sobre isso?

Tânia – Depende do tipo de dança a que você se refere. No balé clássico, é tudo especial. Figurinos totalmente com regras adequadas. A dança moderna, e outras danças, jazz, sapateado, dança de salão, cada uma tem seu estilo próprio. Dentro de cada estilo, há uma criatividade infinita.

Dance – Você sempre trabalhou com esta área de dança?

Tânia – Sim. Fui bailarina clássica. Sou coreógrafa, apesar de hoje estar totalmente dedicada à profissão de figurinista de palco.

Dance – Com essa experiência toda, você tem uma grande vantagem na sua profissão.

Tânia – Eu tenho uma visão muito mais completa do que teria uma costureira, ou mesmo uma pessoa que tenha bastante talento e bom gosto para trajes, ou mesmo tecnicamente bem preparada para isso. Mas essa visão de palco eu tenho na pele, pois participei disso, vivi isso. É claro, então, que me dá quilômetros de vantagem.

Dance – Na prática, como é seu trabalho?

Tânia – Eu crio, desenho e oriento a produção, administrando todo meu ateliê. Trabalho em todas as etapas.

Dance – Você costura, põe a mão na agulha?

Tânia - Não. Mas tive a curiosidade de aprender, porque não acredito que você possa orientar alguém se não entender. Conheço a técnica.

Dance – Quais são os pré requisitos para fazer um bom figurino de dança?

Tânia – Bom gosto. É o único! O resto você consegue comprar, aprender, Consegue tudo.

Dance – Como lidar com os diferentes físicos?

Tânia – Você consegue colocar uma gordinha extremamente linda. A característica física pode ajudar, mas não é um fator determinante no resultado final.

Dance – O que é o mau gosto em roupa de dança?

Tânia – Indo para área da dança de salão, o mau gosto em dança é ir para um baile de calça jeans e tênis. Não tem nada a ver. Por mais sex que seja, por mais lindo que seja, calça jeans não é adequada para dançar, rodar num baile com um cavalheiro.

Dance – E para o homem?

Tânia – Vale a mesma regra. Acho lindo o terno. Tem que ser feito por alfaiate, para ficar perfeito. Uma boa camisa social linda, também com uma pequena gravata, fica muito bonito para dança de salão. A calça deve ser folgada, que permita os movimentos do dançarino. Pode ser com pregas, caindo em cima do sapato, com dobra italiana. Para qualquer estatura, tanto faz. Um colete sobre a camisa social também fica bonito.

Dance – E o que é o bom gosto?

Tânia – Uma belíssima saia rodada e uma cintura muito bem marcada, para deixar que seu parceiro a envolva com muita sensualidade E um tecido lindo, caindo, rodando. Colorido.

Dance – Por falar em cor, que cuidados se deve se ter nesse aspecto? Num espetáculo tem que combinar cor com iluminação. Como é isso?

Tânia – Essas coisas a gente só aprende com a experiência. Há casos em se faz o figurino, com todo capricho, e tem que testá-lo na iluminação. No meu ateliê tenho um protótipo de iluminação de palco. É um spot, igual ao que existe nos teatros, com as gelatinas apropriadas, aquelas que são trocadas, porque a luz é uma só. Faço testes de todo material com diferentes iluminações, trocando a gelatina colorida para âmbar, azul, vermelho, etc, para ver como vai mudando a cor do tecido. Isso me dá uma perspectiva do que posso e não posso fazer.

Dance – A cor da pele da pessoa – branca, morena, negra, mulata, loura, amarela - requer cores adequadas ou não tem nada a ver?

Tânia – Há diferenças sim na escolha da cor. Isso acontece mais em moda. Na dança é diferente. Claro que se você montar um grupo afro, vai evitar trabalhar com cores mais escuras. Mas veja bem, não existe essa coisa de "não poder". Tudo é possível. Só que a gente deve procurar aquilo que vai realçar mais em cena. Há negros que ficam lindos vestidos em preto. Isso tudo depende muito da criatividade do figurinista. E da peça que está sendo montada, sua proposta. Se a proposta pede uma cor escura, ou clara, depende, para interpretar determinada emoção, o figurino terá que ser escuro, ou claro, não importa a raça, ou raças, do elenco. O que determina isso é sempre o tema.

Dance – Ainda no campo das cores: num grupo, em que se usa várias cores, existem questões do tipo "essa cor não se mistura com aquela"?

Tânia – Geralmente, a gente trabalha em conjunto e estreita cooperação com o coreógrafo. Quando ele monta a coreografia, e aqui estou tratando de coreografia livre, não de balé de repertório, ele tem a visão dele, a proposta dele. Então você tem que entender claramente o que ele quer, ele é que vai te conduzir para onde, realmente, ele quer. É importante ver as diferenças entre o figurinista e o estilista. O estilista cria moda. Nós, figurinistas, não criamos moda. Interpretamos as emoções e propostas dos coreógrafos. É claro que existe uma grande dose de criatividade quando a gente faz. Mas essa criatividade tem que estar baseada num gancho, que o coreógrafo nos dá. Ele determina algumas coisas, pois em muitos casos precisa daquilo até para compor a própria coreografia.

Dance – E no caso do clássico, balé de repertório, que você falou antes?

Tânia - No balé de repertório existem regras rigorosas, que considero até dogmas. Essas regras não podem ser ultrapassadas.

Dance – Sua profissão é realmente diferente...

Tânia – É rara. Até no mundo mesmo ela é rara. Existem estilistas que fazem alguns figurinos, como o grande costureiro Lacroix, que fez recentemente um figurino lindíssimo para Ópera de Paris. Ficou deslumbrante. Mas ele é um costureiro. Então é muito raro você encontrar uma pessoa, como eu, que só trabalha com figurinos de dança. No Brasil há diversas costureiras, mas não são figurinistas. Há muita gente no Brasil que costura roupa de dança, o que é bem diferente. O trabalho do figurinista envolve pesquisas e todo um trabalho especializado. Não basta, portanto, ter só conhecimento de técnica de costura. Tem que conhecer dança e, se possível, já ter subido ao palco; tem que conhecer muito História da Moda, porque há pesquisas incríveis, inclusive de roupa de época.

Dance – O figurino de dança é muito caro?

Tânia – Pode ser caro ou barato, depende da produção, a verba disponível para o investimento. A gente tem preços acessíveis até para academias. Já vi costureiras cobrando mais caro do que meu Ateliê. As pessoas parece que ficam com medo de se aproximar, de consultar, acham que tudo é caro, e isso é uma bobagem. Um tutu bandeja (saia em camadas, armada, usada pelas bailarinas clássicas) pode variar de 400 reais a 3 mil reais. Exportamos muito para os Estados Unidos. Lá um tutu bandeja simples custa 400 dólares. Aquilo é uma técnica muito complicada, não é todo mundo que sabe fazer, e tem materiais caros. Se não ficar bem feito, caindo, dobrando, desfigura a interpretação da bailarina. O risco de uma roupa prejudicar uma bailarina num concurso é muito alto. Além disso, um figurino pode alongar ou encurtar a silhueta da bailarina. Engordar ou emagrecer.

Dance – A qualidade do tecido influencia no resultado?

Tânia – Muito. Muito mesmo. Veja o caso da dança de salão. Ela tem obrigação de ter um tecido bom, de caimento, porque ela está muito perto do público. O palco, longe, ainda disfarça um pouco.

Dance – Um tecido muito barato fica horrível.

Tânia – Doi nos olhos, é de matar! A pessoa quando se propõe a concorrer, a se expor, deve fazer um pouco de sacrifício.

Dance – Você já passou por alguma situação inusitada?

Tânia – Sim. A UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro tem um grupo de dança moderna. Eles iam para uma mostra de dança no México e receberam uma verba da universidade seis meses antes. Pagaram 50% para um figurinista e ele sumiu com o dinheiro. Um mês antes da viagem eles chegaram desesperados no meu teliê perguntando o que eu poderia fazer por eles. Tinham o projeto e mais ou menos o figurino já determinado. Aí perguntei: "Quanto vocês têm?" Eles responderam, temos xís. Então eu disse: "não faremos o figurino que vocês queriam, mas o figurino com o que vocês têm". Trabalhamos num prazo muito curto, eles viajaram e ainda ganharam um prêmio.

Dance – Pode revelar algum projeto?

Tânia – Vou fazer um grande vestido rodado, vou num baile lindo, para dançar a noite toda!

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