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Jornal DAA - Col. Leonel Brum - 66

COLUNA LEONEL BRUM


VÍDEO DANÇA

 

Leonel Brum vem integrar a equipe de colaboradores do Jornal Dança, Arte & Ação. Fruto de um convite antigo, esta coluna aborda um tema novo, e que tem mexido com a cabeça dos dançarinos, principalmente os contemporâneos, amigos da mistura de linguagens.

Antenado com os últimos acontecimentos da área, Leonel sintoniza o futuro e conecta nossos leitores com mais este desafio dos tempos modernos. Pesquisador da memória da dança carioca, diretor artístico e fundador de eventos da repercussão de um Dança Brasil promovido pelo Centro Cultural Banco do Brasil – Rio de Janeiro e Brasília ou do Dança em Foco, realizado pelo SESC. Leonel também participa voluntariamente do PEM - Programa Educação pelo Movimento que atende crianças e jovens de famílias de baixa renda da Cidade de Deus - Rio de Janeiro. Pelas mãos deste ativo participante dos novos rumos de nossa dança, abre-se mais um canal de informação no Dança, Arte & Ação: bom programa!


É com grande satisfação que inauguro essa coluna dedicando meu agradecimento a Luis Florião por me convidar para a equipe de colaboradores do Jornal Dança Arte & Ação. Na realidade, trata-se de um convite renovado, pois a primeira de várias conversas que tivemos sobre o assunto ocorreu em 2001, período em que me encontrava completamente envolvido com a finalização da minha dissertação de Mestrado sobre a Dança Contemporânea Carioca da Década de 1990.

Como acredito que tudo chega a seu tempo, essa coluna surge num momento particular em que emerge uma necessidade de se registrar o crescente interesse dos eventos nacionais e internacionais pela produção brasileira de vídeo-dança. O objetivo dos meus textos será o de compartilhar com os leitores as experiências que tenho vivido ao circular por esses eventos divulgando os vídeos produzidos pelos criadores brasileiros. Mas antes de abordar as minhas passagens pelo Ateliê de Coreógrafos Brasileiros e pela Jornada Internacional de Videodanza México, vou tecer algumas considerações sobre o vídeo-dança.

Mas, afinal, o que é vídeo-dança? Por ser uma área ainda muito recente no Brasil, essa é a primeira pergunta que, invariavelmente, surge em todos os lugares por onde a mostra circula no país. Costumo dizer que todas as tentativas de conceituação do vídeo-dança esbarram em inúmeras limitações, pois ainda não existe um conceito que possa dar conta das diversas possibilidades de manifestação desse tipo de obra. Proponho, então, leituras possíveis como, por exemplo, a de que o vídeo-dança seja considerado como a materialização dos pensamentos do coreógrafo e do videomaker numa dramaturgia híbrida que não deixa distinções entre o vídeo e a coreografia. Em outras palavras, pode-se pensar em vídeo-dança como um diálogo entre a dança e o vídeo cujo resultado gera um tipo de obra onde essas linguagens se tornam indissociáveis. E, parafraseando a pesquisadora carioca Thereza Rocha, torna-se, ao mesmo tempo, uma dança feita de vídeo e um vídeo feito de dança. Mas essa é apenas uma das leituras possíveis. Espero ter outras oportunidades de mostrar que o vídeo-dança está longe de ser um simples registro de coreografia em vídeo.

Atualmente, o Ateliê de Coreógrafos Brasileiros é um dos mais importantes e inovadores projetos nacionais de fomento à produção de dança contemporânea brasileira. Capitaneado pela bailarina e produtora Eliana Pedroso, o evento apresentou a sua 3a edição entre 15 e 20 de outubro, no Teatro Castro Alves, em Salvador. Renovada anualmente, a comissão de seleção formada por Adriana Gehres, Cássia Navas, Jussara Miranda, Roberto Pereira e pela própria Eliana Pedroso elegeu, além da Bahia, quatro projetos de montagem de diferentes Estados. Depois de dois meses de processo, os coreógrafos convidados apresentaram os seguintes trabalhos: Construindo Janice, de Kleber Damaso (GO), Relações, de Carlos Laerte (RJ), O Samba do Crioulo Doido, de Luiz de Abreu (SP), Oposto, de Clênio Magalhães (BA), e Vermelho, de Saulo Uchoa (PE). Além dos espetáculos do palco, o Ateliê apresenta também outras atividades paralelas, como debates, palestras, oficinas e a mostra Solos > 40 (bailarinos com mais de 40 anos).

Este ano, o evento inovou ao convidar para programação paralela a mostra de vídeo-dança Painel Brasil, acompanhada da minha palestra. Ao elaborar o programa me dei conta de que três dos vídeos selecionados foram produzidos em edições anteriores do próprio Ateliê, são eles: Por onde os olhos não passam (2003), de Andrea Maciel e Paulo Mendel; Pele (2002), de Ivani Santana, Danilo Scaldaferri e Ana Rosa Marques; e Memórias em desalinho (2003), de Karin Virgínia Girão e Luiz Carlos Bizerril, sendo esse último produzido a partir do espetáculo homônimo criado pela própria Girão para a edição de 2002. O evento tem produzido, assim, de modo espontâneo, algumas obras de vídeo-dança como uma espécie de subproduto de suas atuações. Mas o Ateliê é um projeto desafiador, sobretudo para si mesmo. Talvez, tenha chegado o momento de incluir em seu processo de criação a produção desse tipo de obra, explorando um potencial que já ocorre naturalmente.

Também em sua terceira edição, a Jornada Internacional de Videodanza México, dirigida pela bailarina, professora e videomaker Hayde Lachino, foi realizada entre 27 e 29 de outubro na conceituada UNAM - Universidad Autónoma de México. A programação do evento contou com mesas redondas, oficinas, palestras e uma mostra de vídeos que reuniu títulos de vários países, como: México, Brasil, Argentina e Uruguai. A apresentação dos vídeos brasileiros se destacou e foi a primeira vez que essas obras foram exibidas num grande telão de cinema. Só para se ter idéia, as instalações da Universidade contam com duas grandes salas de cinema, dois teatros (um deles para Ópera), concha acústica e outros modernos espaços culturais.

Pela primeira vez, Lachino tratou de levar convidados internacionais para abrir diálogo com outros países. Além de mim, estava presente a bailarina, coreógrafa e videomaker Silvina Szperling, representando o Festival Internacional de Videodanza de Buenos Aires e a cineasta alemã Lilo Mangelsdorff, exibindo seu documentário intitulado Damas e Cavalheiros com mais de 65 anos, realizado com o elenco de um espetáculo de Pina Bausch. As discussões entre os convidados, os criadores e os produtores locais seguiram no sentido de ser inaugurado, na UNAM, um núcleo de produção de vídeo-dança mexicano, com possibilidades de futuros intercâmbios entre obras e artistas de outros países da América Latina, incluindo o Brasil. A Jornada do México também foi palco da fundação do projeto Circuito Mercosul de Vídeo-dança, envolvendo inicialmente Brasil, Argentina e Uruguai, com possibilidades de desdobramentos também para o Chile.

É importante ressaltar que o interesse pelo vídeo-dança vem crescendo, não somente no Brasil, mas também em outros países sul-americanos. Manter o diálogo com esses países e se aproximar de outros poderá criar uma rede que ofereça uma oportunidade inédita de se estabelecer, em médio prazo, um mercado efetivo de vídeo-dança na América Latina, com a mesma competência e qualidade dos principais produtores da França, Alemanha, Holanda, Inglaterra e Estados Unidos, países famosos pela tradição desse tipo de produção.

 

Leonel Brum é

Pesquisador de dança e curador dos eventos Dança Brasil e Dança em Foco

 

 

 


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