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COLUNA DA CAMINADA
JOINVILLE 22 ANOS: UM
FESTIVAL ADULTO Vinte e dois anos após
ter realizado sua primeira versão, o Festival de Joinville mostra que é um
evento que veio para ficar e, mais do que isso, para contribuir. Longe das meras noites
competitivas, legítimo "Se vira nos trinta", pouco artísticas e muito
apelativas, o Festival firmou-se em função de uma política de bom senso e de
uma organização quase impecável. Pequenos senões não invalidam os inúmeros
acertos que vão do Festival Meia-Ponta às Mostras de Dança Contemporânea. A noção clara de que o
público de fora do eixo Rio-São Paulo tem o mesmo direito de assistir
companhias famosas em obras completas tirou o caráter diletante do Festival;
tornou-o internacional. Este ano o público foi
brindado com o Ballet Estável do Teatro Colón interpretando
"Coppélia" na versão de Enrique Martinez e com o Ballet de Genève. Não foi uma grande
atuação do Colón, em que pese o contratempo da falta de energia, que durou hora
e meia e certamente pesou na apresentação da companhia. Acreditamos, porém, que
muito mais do que isso, a situação do país, problema que conhecemos bem de
perto, parece estar interferindo no produto final de uma companhia tradicional
e famosa pelos bailarinos que tem produzido. Um problema que, sem dúvida, não é
da responsabilidade do Festival. Importante, para nós, do
Theatro Municipal do Rio, foi a comparação inevitável. O Corpo de Baile
revelou-se, indiscutivelmente, muito superior, tanto como intérprete da obra
como um todo e de cada personagem em particular. Nossas Svanildas e nossos
Franz são famosos desde a década de cinqüenta e Dennis Gray: bem, ele é um
verdadeiro doutorado - sem trocadilho - em Coppélius. Sua criação é inimitável
e gerou uma estirpe de grandes intérpretes do papel. O Ballet de Genève, em
compensação, foi de excepcional nível. No programa "Remanso", poética
e inspirada composição de Nacho Duato, reportando-se a Garcia Lorca, sobretudo
na delicadeza da rosa vermelha presente em cena ao longo de todo o ballet,
tornando-se rubra no final, tão rubra quanto o sangue derramado do grande
poeta, assassinado pela ditadura Franco; "Para-Dice" de Saburo
Teshigawara e "Selo Desir" de Andonis Foniadakis completaram o
espetáculo marcado pela presença de quatro bailarinos brasileiros. Bruno Cesário, um dos
destaques da companhia, prestou audição com mais de 80 bailarinos, na qual foi
o único aprovado, e estará na próxima temporada integrando o elenco do Ballet
Real da Suécia dirigido pelo famoso Matz Ekk. Os cursos,
procuradíssimos, demonstram o interesse da categoria por novas informações
e aperfeiçoamento; sem falar na
renovação dos quadros de professores, verdadeira chance de conhecer novos e preparados
profissionais de todas as áreas ligadas
à dança cênica. Os palcos alternativos
constituem-se num sucesso que repercute por toda a cidade, a ponto de já haver
grupos interessados em participar apenas dessas apresentações alternativas,
sempre concorridíssimas. É fácil encontrar os candidatos aquecendo-se para as
apresentações no Centreventos, recebendo do público um retorno do brilho de
suas performances e ouvindo as últimas orientações de mestres e ensaiadores. A Feira de Sapatilhas e
a Praça de Alimentação até diminuíram, o que só favoreceu o Festival. O ruído e
o cheiro de comida, que antes atrapalhavam e acentuavam o caráter de ginásio do
Centreventos agora ficam de outro lado, cumprindo seu verdadeiro papel num
evento artístico: proporcionar momentos de lazer e compras de bom preço sem
perturbar os espetáculos. Por outro lado, os
debates, há três anos pouco procurados, firmaram-se definitivamente. O Teatro
Juarez Machado ficou repleto para todas as mesas. Tive o prazer de
participar da segunda mesa "O Ballet clássico é a base para todas
as danças?" com João Wlamir, ambos "a favor" do clássico,
contraponteando Alejandro Ahmed e Sílvia Sóter, "negando" o ballet.
As aspas já evidenciam o que de fato ocorreu: nem nós, defensores da
extraordinária técnica de dança clássica, achamos que ela prepara para todas as
danças - o que a Índia, por exemplo, tem a ver com ballet? - e mais,
sabemos que o bailarino clássico de hoje precisa de outras disciplinas que o
complementem para que seus artistas estejam preparados para as exigências da
contemporaneidade, nem Sóter e Ahmed negaram, ao contrário, afirmaram o valor
insubstituível do ballet como técnica preparadora de bailarinos em
termos de abrangência de mercado de trabalho. O encontro foi marcado
pela cordialidade, diria até mais, afetividade, respeito entre profissionais
que, acima de tudo, amam dança. Por fim, as noites
competitivas revelaram um visível progresso no que tange à orientação artística
das academias. A grande surpresa - e preocupação - de os jurados encontrarem os
candidatos que haviam se apresentado na noite anterior se transformou em grande
encontro. Desconhecidos, uns dos outros, bailarinos, e jurados viveram momentos
até emocionantes. Poucos foram os candidatos que demonstraram
insatisfação. Este Conselho - Ady Addor,
Alejandro Ahmed, Roseli Rodrigues e Roberto Pereira - está de parabéns. O
concurso ficou mais transparente e o júri, que atua quase como um tradutor
simultâneo, vendo e escrevendo ao mesmo tempo, pôde explicar melhor o que
escreveram a candidatos e orientadores sedentos de orientação. Esses acertos respondem
à questão colocada na primeira mesa: "O Festival contribui para o
aperfeiçoamento da dança?". Sim, até porque, com o modelo atual, congrega,
funde, troca, enriquece, informa. E mesmo nesse ponto,
quanto ao ballet clássico, viva o ballet do Brasil. Há que se pensar numa
medida para estimular a participação de grupos de danças populares brasileiras.
Não se justifica que o Brasil, tão rico de danças, ritmos e raças, não esteja
representado de norte a sul. Palmas para o grupo de Belo Horizonte que se
apresentou dançando Malambo, dança do Sul, biscoitando um segundo lugar,
vencido, com absoluta justiça - eu não julgava esta categoria, que fique bem
claro - pelo grupo do Paraguai. No sentido de contribuir
para a evolução do próprio evento registrei alguns detalhes que precisam ser
revistos, na minha opinião: 1. O programa da estréia
precisa ser elaborado por alguém da área. Não se concebe programa de um ballet
completo onde não constem os nomes dos personagens, sobretudo o principal, o
que inspirou a obra: dr. Coppélius. Mas não apenas ele: o público precisa saber
os nomes dos "amigos" de Swanilda e Franz, da "Aurora", da
"Prece", dos solistas da czardas e da mazurca, dos artistas dos
conjuntos, de todos os que participaram daquele espetáculo e onde o fizeram,
enfim. Facílimo de ser contornado, não justifica que se repita. 2. Já que o espetáculo
não tem orquestra, a música que precede um ballet de repertório,
sobretudo do século XIX, de características românticas, precisa cumprir o papel
de introduzir o público na atmosfera do que vai ver. Música bate-estaca,
excessivamente barulhenta, nesses casos, perturba e é até antipedagógica. Por
outro lado, foi de suprema sensatez esperar terminar o jogo de futebol
Brasil/Argentina, respeitar a manifestação de torcida do público, participar
dela, e só então começar o espetáculo. Até porque o Centeventos é um ginásio,
não um teatro italiano padrão e formal. Na verdade tudo se resume a bom-senso. 3. Flores devem ser
entregues aos artistas principais assim que acontece o primeiro agradecimento,
quando a platéia ainda aplaude e participa, portanto, da homenagem. 4. As flores oferecidas
a uma bailarina devem ser bonitas, mas arranjadas com simplicidade, em forma de
buquê mesmo. Até porque, muitas bailarinas têm o simpático costume de destacar
uma flor e oferecê-la a seu partner. 5. Discursos em
intervalo de ballet definitivamente não. Não é a hora, não é o lugar
certo, constrange o homenageado, que se é uma autoridade traquejada sabe que o
momento de tal manifestação não é aquele. E trata de apressar a homenagem antes
que o público reclame. 6. Um coquetel que
reunisse os professores dos cursos, as companhias convidadas, os conselheiros,
o presidente e o diretor do Instituto Festival de Joinville e os jurados das
diversas categorias seria simpático. Não conseguimos ver, muito menos conversar
com os bailarinos do Colón. 7. As reuniões com os
jurados depois da apresentação de cada categoria precisam de um pouco mais de
tempo. Quando as colocações são consensuais não há problema, mas muitas vezes o
bom nível dos candidatos suscita discussões que precisam ser esgotadas até se chegar
a um denominador comum. A arte é sempre subjetiva, nisso reside sua magia; mas
essa subjetividade gera profícuas mas, por vezes, prolongadas conversas. 8. O tempo destinado à competição de conjunto de
repertório merece ser reavaliado e ampliado em um ou dois minutos. Afinal, em
cinco ou seis grupos essa minutagem não excederá 12 minutos, suscitará muito
menos discussão entre participantes e premiará a boa dança, algumas vezes
prejudicada pelo aceleramento do tempo para caber nos 8:30 permitidos pelo Festival.
De fato, poucas são as danças de conjunto que têm menos de 10 minutos. Se tal
exigência for totalmente respeitada o público verá todo ano apenas os poucos
trechos que correspondem ao adotado. Eliana Caminada é professora de História
da Dança na UniverCidade e Universidade Castelo Branco e foi primeira bailarina do Theatro
Municipal – RJ Página pessoal: http://www.geocities.com/caminadabr/index.html
Eliana
Caminada é professora de História da Dança na
UniverCidade e Universidade Castelo Branco
e
foi primeira bailarina do Theatro Municipal RJ
Página
pessoal:
http://www.geocities.com/caminadabr
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