Jornal DAA - Col. da Caminada - 48
COLUNA DA CAMINADA
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MISCELÂNEA
Boa crítica
1: A Companhia Vacilou Dançou está completando vinte anos. É tempo da boa
crítica, de comemoração e reconhecimento pela garra de sua fundadora, Carlota
Portella, e de seus principais colaboradores. Portella soube construir uma trajetória
honesta, diversificada e generosa, presenteando o público com sucessivos espetáculos
bem elaborados, dividindo o espaço de criação com outros coreógrafos, abrindo
mercado de trabalho para inúmeros bailarinos, procurando o melhor de seu tempo
sem concessões. O espetáculo atual aborda o universo difícil e introvertido
de Clarice Lispector. Foi um achado. A performance é impecável; dos excelentes
bailarinos às trilhas sonoras de Fernando Moura e Fabio Cardia, passando pela
presença de assistente de coreografia de Paula Águas, pela iluminação de Binho
Schaefer, tempo de duração dos números e figurinos. 'Um sopro d'ela' é uma criação
densa que reflete a capacidade da Carlota coreógrafa de acompanhar a estética
contemporânea sem se acomodar, caminhando sempre; 'Diga-me que horas são, para
saber que existo' de Mário Nascimento transmite angústia, sensualidade, modernidade
e urgência. Carlota Portella desempenha um importante papel no desenvolvimento
da dança contemporânea no Brasil. A ela nossas homenagens com a certeza de que
esse aplauso, que já não é mais só brasileiro, continuará ecoando com e apesar
de todos os riscos.
Boa crítica
2: Lendo a crítica de minha companheira Sílvia Sóter em 'O Globo' do dia
02-08-01 sobre o espetáculo 3 x América do Corpo de Baile do Theatro Municipal
do Rio de Janeiro pensei: 'Diante de uma crítica tão isenta, sensata e sensível
nada tenho a acrescentar'. Sem pretender fazer a crítica da crítica, mas respeitando
e admirando a capacidade de entender dança que há tanto tempo reivindicamos
para um dos principais jornais do país, peço licença para fazer minhas palavras
dela como, por exemplo: '...Mas, com certeza, o grande presente que 3 x América
oferece ao público é poder ver a companhia do Balé do Teatro Municipal aproveitada
integralmente, com versatilidade e competência'. Disse acima que nada teria
a acrescentar mas, dando continuidade a minha preocupação pessoal de mencionar
os nomes dos colegas que atuam com destaque nos espetáculos, gostaria de registrar
também os desempenhos diferenciais de Ana Botafogo, mais uma vez, mostrando
que quem sabe faz a hora, e Áurea Hammerli no apenas correto 'Tango' de Gustavo
Molajolli. Os de Regina Ribeiro - um destaque e tanto, sem dúvida -, Wellington
Gomes, Carlos Cabral e demais bailarinos no maravilhoso 'Maple leaf rag', lindamente
- também segundo opiniões de profissionais abalizados para falar sobre a técnica
de Martha Graham, incluindo o próprio remontador em declarações pessoais -,
dançado por nossos bailarinos. Roberta Marques e Thiago Soares valorizando o
excelente 'Capricho' de Tíndaro Silvano, deixando claro porque voltaram premiados
de Moscou, e Rita Martins, Laura Prochet e Rodrigo Negri, uma festa de alegria,
juventude e competência no 'Nascimento' de David Parsons. Essa é uma companhia
que amo, que faz parte de minha vida e da qual, amadurecida, me orgulho de ter
pertencido. Vê-la elogiada por outros críticos constitui-se numa enorme satisfação
pessoal, ainda que não esteja mais dentro dela.
Boa crítica
3: Dança de salão, por que não? É muito prazeroso sentar numa poltrona e
assistir à Companhia de Dança Jaime Arôxa. Não só pela excelente execução de
todas as danças, mas também pela criatividade das coreografias. Quanto à dramatização
que ele, assim como tantos outros, está introduzindo nos seus espetáculos, é
mais do que legítima, é quase óbvia. Qualquer profissional quer crescer e levará
um tempo até adaptar o seu discurso a outro espaço cênico. É possível afirmar
que 'O homem, a mulher e a música' tem início com um excelente texto teatral
que Arôxa não consegue sustentar, que falta mais brasilidade ao espetáculo;
mas ele tem talento suficiente para realizar plenamente o que está só começando.
Diante de tanta experiência, algumas tenebrosas, de tanto bailarino que se intitula
e não é, por que tanta rigidez, diria mesmo, preconceito com a dança de salão,
com a dança folclórica e com da dança de rua? Comentários do tipo 'eles querem
ser bailarinos e não são' revelam uma predisposição contra uma categoria de
artistas que, se aplicadas a tudo que vemos, muito espetáculo sairia de cartaz
ou nem seria montado. 'Nordestenamente', excelente realização de Fernando Bicudo
à frente do Theatro Arthur Azevedo, foi criticado pela sua pretensa falta de
autenticidade. Na ocasião perguntei a experts em folclore - não tenho a menor
pretensão de conhecer tudo e todos - que me asseguraram a seriedade da pesquisa
de movimentos em todas as danças. Só que era folclore encenado, lindo, bem vestido
e bem iluminado e, aparentemente, isso não agrada a certos segmentos da área
cultural. João Carlos Ramos é outra vítima desse radicalismo que não constrói
e exclui muita gente boa do mundo cênico. Jaime Arôxa é criticado por colocar
elementos estranhos à dança de salão nas suas coreografias, mas o Balé de Rua
de Uberlândia é criticado por não fazê-lo. Na verdade o que fica claro é que
alguns críticos acham que determinados palcos não podem conviver com linguagens
mais populares. Será que não? Será que temos o direito de impedir que artistas
que já ultrapassaram os limites de suas linhas de trabalho encontrem novas possibilidades
de criar e fugir do lugar-comum, ainda que com erros e acertos? Será que os
pretensiosos não somos nós quando julgamos que tudo o que é desagradável é Arte
e que tudo o que entretém é menor e não merece compartilhar palcos? Pessoal,
vamos rever posições e, acima de tudo, com sensatez, procurar manter viva a
chama da boa dança, não importa de onde venha, na alma do povo brasileiro. Ou
será melhor ver marcação de grupo de pagode, de axé, de funk e outras bobagens
vulgares e de mau-gosto, no lugar de bailarinos que dançam muito bem e que estão
encontrando sua forma cênica corajosa e honestamente?
Boa crítica
4: Um sucesso a apresentação de Ana Vitória Freire na Mostra de Dança Contemporânea
no 19º Festival de Dança de Joinville. Não pude assistir à apresentação mas
conheço a obra desde sua estréia no Rio e sobre ela já teci comentários. Elogiei,
inclusive, o excelente trabalho de Andréa Bergallo como bailarina e como ensaiadora.
Ana Vitória vai construindo sua trajetória com segurança e vencendo desafios
como o fez em 'Trânsito', trabalho montado para o Balé Guaíra onde, apesar de
algumas hesitações ao tratar do conjunto, atinge momentos de verdadeira poesia
e riqueza de vocabulário coreográfico.
Boa crítica
5: Estreou com 'Danças Ecléticas' a Cia Nobre de Dança. Ao lado da recém
reativada Companhia Brasileira de Ballet de Jorge Teixeira. O ballet clássico
vai resistindo, conseguindo ocupar algum espaço fora do Theatro Municipal do
Rio. Pois que sejam bem vindos. O Rio pode, o Brasil precisa 'até' de ballet
clássico.
Eliana
Caminada é professora de História da Dança na
UniverCidade e Universidade Castelo Branco
e
foi primeira bailarina do Theatro Municipal RJ
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pessoal:
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